O espetáculo conta a história de um grupo de pessoas em uma estação, à espera do trem. Cada qual traz consigo alguns sonhos, desejos e esperanças. O espetáculo não tem texto falado, as ações e as cenas vão surgindo, uma a uma, de coreografias, gestos e movimentos.
Classificação: Livre
Duração: 50 minutos
Companhia: Delirivm Teatro de Dança
Direção: João Butoh
Elenco: Aparecida Mercedes Lucarini, Cátia Buono de Oliveira, Delcina Pereira Bordignon, Francisco J. D. Moreira, Manoel Pereira, Maria Aparecida A. Pereira, Maria Stella P. de Souza, Rita Maria Guimarães, Vandette Tubero D. Moreira e Victório Kiritschenko
Ao abusar do gestual, companhia Delirivm faz plateia reverenciar o silêncio. Trupe de São Simão participa pela terceira vez do Festival de Curitiba.
Por Tiago Gonçalves.
Quando termina o espetáculo "E Toda Vez Que Ele Passa, Vai Levando Qualquer Coisa Minha...", o espectador reverencia o silêncio. Não à toa. Por bons momentos, a plateia passa a degustar a economia das palavras descartáveis proposta pela Delirivm Teatro de Dança, radicada em São Simão. Depois de enjoarem da mudez, os comentários ligeiros brotam dos espectadores mais tocados: "Simples. Não precisou dizer nada", comentou uma garota, enquanto desamarrava sua bicicleta de um orelhão.
Se no palco apenas suspiros ou gemidos são permitidos, fora dele os integrantes (todos na casa dos "entas", de 57 para cima) da trupe esbanjam da fala. E como falam. Um almoço no shopping com a trupe é um prato cheio para gargalhadas e reflexões. Novamente, não à toa. As histórias por ali, são muitas. Enquanto um conta o passado dedicado ao futebol, outro narra as peripécias dos antepassados, imigrantes ucranianos. E por aí vai! Se der corda, o papo vem e a hora vai.
Digressões à parte, "E Toda Vez", em cartaz desde 2003, conduz ao espectador a uma fabulosa estação de trem, adormecida no tempo (e no silêncio). Estando diversas figuras por lá, arquétipos dos anos que se foram; histórias desfilam como modelos, mas sem tanta pompa. Afinal, aquelas figuras estão presas, à espera de um vagão, que nunca para. E se parasse, pode pensa o espectador, mas não para. "É o reflexo do abandono. Estão lá, sem a interferência de fora", explica o diretor. Ao espectador uma dúvida paira e o diretor coloca pilha: "Podem ser fantasmas sim, que vagam por ali há tanto tempo".
simbólico, a concepção do elenco bebe no real. Ao mesmo tempo em que trazem vivências pessoais ao papel, os intérpretes enxergam no outro que já se foi tamanha inspiração para completar a personagem. "Me baseei em Ceci, minha professora de piano", conta uma. "Já eu em Dona Coló, uma velha muda, surda e enxerida", lembra outra. Por outro lado, o espetáculo também estaciona na situação, como aponta o diretor, da estação de trem de São Simão. "Esquecida!"
"E Toda Vez..." se constrói a partir de duas técnicas. Apesar de um sopro de butô ("olhar para dentro de si, mas com uma dimensão espacial"), a cena flerta com o Teatro-dança proposto por Mary Wigman, com a cadência do expressionismo alemão. Aliás, Pina Baush bebeu na fonte de lá. Portanto, um compromisso com a liberdade e emoção no gestual. Expressa a potencialidade do corpo que dialoga com objetos e está a serviço do intérprete. Instiga os movimentos cotidiano ao transformá-los em dança", comenta o diretor, perito da modalidade no País.
A trupe
A Delirivm Teatro de Dança nasceu em 1986, sob a tutela da Ogawa Butoh Center, coordenada por João Butoh. Em 25 anos, a companhia da "maior idade", como a define João Butoh, aventurou-se por quatro montagens. Além de "E Toda Vez...", "Mulieribus" ("retalhamos a história para evidenciar os momentos em que as mulheres foram protagonistas", lembra o diretor), "Anjos Caídos" ("mostra a terceira idade em São Simão, algo que está a quem da sociedade") e "Claire de Lune", que narra as venturas de artistas que sonham. "Este estrou em 2003, aqui no Festival. Neste mesmo ano, apresentamos ainda "Mulieribus", que remontaremos em breve".
A trupe não para. Quer cair ainda mais na estrada com "E Toda Vez...", rodar os lugares onde as estações ferroviárias ainda velam de pé; mas não deixa em esboçar nova produção. O tema da vez será: Alzheimer. O figurino, cenários e até o nome do espetáculo: "Para Quando Eu Esquecer de Mim" já foram definidos. Em compensação, a pesquisa ainda engatinha. "Não temos pressa. Nosso processo é lento. Estamos ainda atrás de histórias de pessoas que perderam seus referenciais a partir da doença", explica Butoh.
Veja abaixo algumas fotos do espetáculo de ontem (01/04), clicado por Andréa Motta.
Festival de Teatro de Curitiba |
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