sábado, 6 de agosto de 2011

Emiliano Perneta: O Príncipe dos Poetas Paranaenses

Emiliano David Perneta (Pinhais, 3 de janeiro de 1866 — 21 de janeiro de 1921).

Biografia: Nascido em um sítio de Pinhais, na zona rural de Curitiba, incorporando ao sobrenome um apelido de seu pai.
Considerado maior poeta paranaense, começou influenciado pelo parnasianismo. Foi abolicionista, tendo feito palestras em defesa dos ideais libertários. Publicou artigos políticos e literários, assim como passou a incentivar, em Curitiba, a leitura do escritor Baudelaire, fato marcante para o surgimento do simbolismo no Brasil.

Publicou seus primeiros poemas em O Dilúculo, de Curitiba, em 1883. Mudou-se para São Paulo em 1885, onde fundou a Folha Literária, com Afonso de Carvalho, Carvalho Mourão e Edmundo Lins, em 1888. No mesmo ano publicou as obras poéticas Músicas, de versos parnasianos, a Carta à Condessa D'Eu. Foi também diretor da Vida Semanária, com Olavo Bilac, e colaborador do Diário Popular e Gazeta de São Paulo.

Republicano no Império, tanto que no dia 15 de novembro de 1889 formou-se em direito pela Faculdade do Largo de São Francisco[1], sendo escolhido orador da turma, fez um discurso inflamado em defesa da República, sem saber que a mesma havia sido proclamada horas antes no Rio de Janeiro.
Mudou-se para o Rio de Janeiro em 1890. Lá, colaborou com vários periódicos e, em 1891, foi secretário da Folha Popular, na qual foram publicadas as manifestações inicias do movimento simbolista, assinados pelos poetas B. Lopes, Cruz e Sousa e Oscar Rosas.

De volta ao Paraná, criou a revista simbolista Victrix em 1902. Em agosto de 1911, ao retornar para Curitiba, foi aclamado “príncipe dos poetas paranaenses” em uma festa no Passeio Público[3]. Em 1913 publicou o poema livreto Papilio Innocentia, para a ópera do compositor suíço Léo Kessler, sobre o romance Inocência de Visconde de Taunay.
Sua obra poética inclui Ilusão (1911), no qual se faz presente a estética simbolista, Pena de Talião (1914), os póstumos Setembro (1934) e Poesias Completas (1945).

Em 19 de dezembro de (1912) participou da fundação do Centro de Letras do Paraná, sendo seu presidente de (1913) a (1918). Pelo seu dinamismo e obras, foi homenageado por diversos contemporâneos, entre eles, Nestor Victor, Lima Barreto, Andrade Muricy. Tais homenagens aconteceram em vida e também após a sua morte, ocorrida no dia 21 de Janeiro de 1921 na pensão de Oto Kröhne, na Rua XV de Novembro, 84.

Um Poema de Emiliano:

SOL
(Ao Dario Vellozo)

Crepúsculo indeciso. As estrelas começam a apagar-se, uma a uma, como lâmpadas que se extinguem. Zéfiro sopra. E num vago sussurro harmonioso, a pouco e pouco, a natureza acorda. Ouvem-se vozes longínguas e dispersas ...

Um pássaro:
– Vai despontar a luz.

Outro pássaro:
– Pois que desponte logo.
Tenho ânsias de subir, tenho a cabeça em fogo.
Hoje vou conhecer, pela primeira vez,
A voluptuosidade, a febre, a embriaguez
De voar, de voar, ó sonho que me abrasas!

Outro pássaro:
– Ah! que bom de fugir! Que orgulho de ter asas!

Outro pássaro:
– Estou ébrio de amor. O amor é como o vinho.
Que venha logo a luz. Quero fazer meu ninho...

Um galo:
– Dentro desta canção, tão límpida e sonora,
Há matizes de luz e púrpuras d’aurora.

Um corvo:
– Eu sou a podridão e o vento que arrasa;
Sou a fome e a nudez... O sol é a minha casa.

O monte:
– Que solidão sem par, que solidão extrema,
A solidão cruel e áspera de um monte;
Mas quando o sol me toca, é como um diadema,
Aurifulgindo aqui por sobre a minha fronte...

O charco:
– Água esverdeada e suja e pântano sombrio,
Mas quando o sol me doura esta miséria, eu rio.

A floresta:
– Ó delírio brutal! Quando me mordes tu
A carne toda em flor, o seio todo nu,
Com teus beijos de fogo, eu, como a flor do nardo,
Recendo de prazer, e de luxúrias ardo...

Uma árvore:
– Quando ele bate aqui no meio da floresta:
Que sussurro, que ardor, que anseios e que festa!

Uma cigarra:
– Faz tamanho rumor e tamanha algazarra,
Que eu suponho que o sol é como uma cigarra...

Outra árvore:
– E que perfume tem!

Outra árvore:
– E que canções vermelhas!

Outra árvore:
– Nós somos como a flor, ele, como as abelhas!

A terra:
– Quanto me queima o sol, com os seus desejos brutos!

A videira:
– Ó glória de florir e rebentar em frutos!

A palmeira:
– Como gentil eu sou! E o aroma que trescala,
Quando me lambe o sol e o zéfiro me embala!

O orvalho:
– Ao sol eu brilho mais que a pérola d’Ormuz...

O pinheiro:
– Eu sou como uma taça erguida para a luz...

As fontes:
– É um murmúrio sem fim de horizonte a horizonte...
O dia quando nasce é bem como uma fonte...
Através da floresta e desse campo e desse
Vale, há um rumor de luz, como água que corresse...

A abelha:
– Quando sobre o horizonte esse astro heroico assoma:
Que orgulho, que prazer, que vibração cruel.
Pois é de sol e flor, é de luz e aroma,
Que componho esta cera e fabrico este mel!

Um pássaro:
– Ah! que alado frescor tem o romper d’aurora!

Outro pássaro:
– É tempo de fugir, é tempo d’ir-me embora...

Outro pássaro:
–É nesse lago azul que hoje quero roçar
As asas...

Outro pássaro:
– E eu é sobre as ondas desse mar...

Um pastor:
– Eu nunca vi o céu de uma beleza assim:
É todo de ouro e rosa e púrpura e carmim...

Outro pastor:
– Dentro daqueles véus ideais do rosicler;
A aurora tem a graça e o ar de uma mulher...

Outro pastor:
– Mas ei-lo que surgiu, em rufos de alvoroço,
Brilhantemente nu, divinamente moço,
Eterno de frescor juvenil e tamanho,
Como se viesse de um maravilhoso banho,
Feito de águas lustrais, e aroma, e ambrosia,
E coragem, e luz, e força, e alegria ...

Uma rosa:
– E que límpido céu! Que espetáculo rubro!

Outra rosa:
– É realmente bela esta manhã de Outubro!

Um beija-flor:
– Eu nunca vi assim manhã tão luminosa...

Outro beija-flor:
– É fina como o lírio e é ardente como a rosa...

Um pastor:
– Quando o sol aparece em ondas, a beleza
E a frescura, que espalha, é de tal natureza,
Tem um olhar tão bom, tão novo, tão jocundo,
Que toda madrugada é o começo do mundo...

A floresta:
– Tu me beijas, ó sol, tão loucamente, espera,
Que eu em pleno fulgor ideal de primavera,
Debaixo desse fogo ardente de teus beijos,
Em delírios de amor e amplexos de desejos,
Arrebentando em flor, completamente louca,
Ofereço-te o seio, ofereço-te a boca!

Um pássaro:
– Aqui, onde eu estou, deste raminho verde,
Quero subir até onde a vista se perde...
Quero aos raios do sol minhas asas bater,
Até cair no chão, bêbado de prazer...

As ovelhas:
– Luz radiosa e pura, ó fonte criadora,
Luz que faz germinar em grãos a espiga loura,
E que veste de verde os campos seminus.
Bendita sejas, flor, bendita sejas, luz!

O poeta:
– Ah! Que sombria dor e que profunda mágoa
De não poder ser eu aquela gota d’água,
Que depois de fulgir, assim como uma estrela,
Derrete-se na luz, funde-se dentro dela!
(Emiliano Perneta)

SOL é o poema final do livro Ilusão,
lançado originalmente em 21/08/1911, em Curitiba
Digitação e atualização ortográfica:Ivan Justen Santana

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